quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Androginia liberta a moda do feminino e do masculino

Andrej Pejic é o modelo que tem atraido a atenção de estilistas e editores de moda por sua aparência dúbia. Foto: Reprodução Andrej Pejic é o modelo que tem atraido a atenção de estilistas e editores de moda por sua aparência dúbia
Foto: Reprodução
Ale Ougata
As últimas temporadas de moda resgataram o espírito libertário dos anos 70 para modificar a ortodoxia e propor uma nova postura tanto nas vestimentas quanto na caracterização dos modelos. Vivienne Westwood pintou a boca dos meninos com batons vermelho, rosa e vinho na passarela de Milão. Paul Smith, em Londres, investiu em mulheres graciosamente masculinas em seus trajes. E, mesmo no Brasil, a moda encarou esta confusão de sexos nos desfiles da Osklen e de João Pimenta.
Um dos modelos mais badalados do momento atende pelo nome de Andrej Pejic. É um sérvio de 19 anos de traços extremamente delicados. Não à toa é que Jean Paul Gaultier transformou o garoto louro em uma bombshell. Em entrevista ao Daily Best, o moço disse não se importar com a polêmica que cerca os editoriais que participa - ele quer ser símbolo de uma geração em que as diferenças nas atitudes masculinas e femininas não sejam o centro da discussão. Para uma outra publicação inglesa completa, "a indústria fashion é muito liberal. Você pode ser você mesmo, só não pode ser gordo".
Se esta é uma tendência que representa o desejo do mercado em diluir as fronteiras entre o alfa e o beta para resultar em um gama ou, ainda, afirmar a androginia como o terceiro sexo, Alisson Chornak da Way Model disse ao Terra que "o mercado de moda tanto nacional como internacional vive em busca constante de novidades, desde os meninos mais bonitos como os mais modernos. A androginia, no entanto, é algo delicado já que este tipo de beleza serve para clientes e mercados específicos. Como booker estou sempre à procura de novos perfis para suprir a necessidade do mercado editorial".
Marco Aurelio Casal dey Rey, diretor do departamento fashion da Ford Models falou que "buscamos por modelos esguios com boa altura para a passarela e com beleza diferenciada no mercado de moda. O fato dos modelos iniciarem muito jovens a carreira, acaba por mostrarem uma beleza mais angelical, mas não significa androginia e sim, juventude, frescor. É o caso do vencedor do Supermodel Brazil 2010, Fabricio Bach, que estreou com sucesso nas passarelas das semanas de moda nacional. À medida que o tempo passa, os modelos criam feições mais maduras e másculas, o que também garante bons resultados, como é o caso de Evandro Soldati, Rafael Lazini e Mihaly que têm belezas mais clássicas".
Costanza Pascolato, nos idos dos anos 80, escreveu em um artigo de jornal que "a androginia é a forma de expressarmos nossas ideias mutantes sobre o que é ser homem ou mulher". A professora de literatura da Universidade de Arte da Filadélfia nos Estados Unidos, Camille Paglia, radicaliza ao expor no livro Personas que "a androginia serve para anular os homens. Significa que eles devem ser como as mulheres, e estas podem ser o que quiserem".
Em outubro de 2010, o articulista do jornal The New York Times levantou a tese sobre modelos masculinos com acentuada curva feminina, o que ele chamou de "trend das moças". Segundo o jornalista, os rapazes estavam aparecendo com corpos de mulheres com direito até a cinturinha de pilão. O motivo foi explicado com uma analogia à recessão econômica: "a masculinidade está ligada ao momento econômico e à perda da segurança. Quando o tempo é difícil, ele pede um homem mais durão. Se as coisas melhoram, o homem se liberta e fica mais leve, com menor necessidade de autoafirmação".
Engana-se quem pensa que só a moda tem a ousadia de eliminar as porções homem e mulher. A música pop encontrou na figura de Lady Gaga a versão atualizada - salva às diferenças-, de David Bowie. Basta observar a capa da Vogue América de março e se perguntar se é um homem, uma mulher ou uma terceira coisa? Ou relembrar a Vogue Hommes Japan em que a mesma cantora encarna seu alterego, Jo Calderone. Ela não está isolada. Outros ícones a acompanha: Mika e Bill Kaulitz, e os que a antecede: Boy George e Marilyn Manson.
No cinema, Pier Paolo Pasolini em Teorema caracterizou uma espécie de anjo exterminador que seduz todos os membros de uma família conservadora. Na literatura, Grande Sertão Veredas, de João Guimarães Rosa, espelha a duplacidade da androginia na personagem Diadorim que provoca uma paixão dúbia em Riobaldo. E o que falar do americano Andy Warhol que fez uma Marilyn Monroe que é ele próprio?
Talvez tudo seja sintoma de uma geração que tem a sexualidade mais fluida, dos meninos que usam saias e das garotas de cabelos curtíssimos. Símbolos do unissex cheios de nuances que seduzem e confundem. Personalidade de quem tende a pertencer a nenhum sexo determinado. Acúmulo dos tempos que visa um futuro em que desaparece a separação entre "coisas de menino" e "coisas de menina".

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